sábado, 29 de março de 2008

Comores: Um novato africano


No dia 17 de novembro de 2007, a pequena população de Comores estava em polvorosa: pela primeira vez a seleção nacional do país jogaria em solo comoriano. O jogo, válido pelas Eliminatórias da Copa do Mundo e da Copa Africana de 2010, era contra a vizinha seleção de Madagascar. Um mês antes as duas seleções se enfrentaram no jogo de ida e os malgaxes levaram a melhor, ganhando por 6x2. No entanto, o resultado era o que menos importava para os torcedores locais. Só o fato de ver sua seleção tão perto e participando das Eliminatórias de uma Copa Mundial e Continental já foi uma experiência que jamais será esquecida. A partida foi jogada em Moroni, capital de Comores, e terminou em 4x0 para Madagascar. Apesar de ter sido fundada em 1979, a Federação Comoriana de Futebol é a "caçula" da CAF, já que se filiou ao organismo máximo do futebol africano em 2003. Anteriormente à sua filiação, a seleção disputava apenas uma competição válida pelos Jogos das Ilhas do Oceano Índico, que são uma espécie de Jogos Pan-Americanos das ilhas que fazem parte da região. E foi nessa competição que o futebol comoriano atingiu sua melhor colocação num torneio internacional: ficou em terceiro lugar nas edições de 1979 e 1985. Já em 2005, a Federação Comoriana foi a 206ª a se filiar à FIFA, o que lhe conferiu o direito de participar do programa "Win in Africa, with Africa" (Vença na África com a África), que visa fomentar o desenvolvimento do futebol africano. Com a implantação do programa, a esperança dos comorianos é construir um estádio com capacidade para receber jogos internacionais. Atualmente a seleção de Comores recebe seus jogos no Stade de Beaumer, que é um estádio que abriga futebol, turfe e atletismo. Numa segunda etapa, estão previstos investimentos em melhorias da infra-estrutura e nas categorias de base do futebol comoriano. Percebendo o crescimento do futebol em Comores, alguns jogadores franceses com cidadania comoriana já defendem a seleção: é o caso de Salim M´ramboini (defende o Martigues, da 3ª divisão da França) e Djamar Mohamed (que joga no Marseille Endoume, time da 4ª divisão francesa).

Conhecendo Comores


As Comores são formadas por três ilhas: Ngazidja (ou Grande Comore), Mwali e Nzwani. Estão localizadas no Oeste da África, entre a costa de Moçambique e a ilha de Madagascar. O primeiro contato com o Ocidente ocorreu em 1505, quando uma esquadra portuguesa passou por Ngazidja. Desde então, Comores passou a servir como porto de apoio para escalas de navios que iam à costa da Península Arábica. Vislumbrando um potencial portuário para as ilhas, os franceses, que já colonizavam Madagascar, passaram a colonizar também Comores.
O país obteve a independência da França em 1975 e se tornou uma República Islâmica até o ano de 2002, quando mudou seu nome oficial e passou a ser chamada União das Comores. No entanto, as ilhas de Mwali e Nzwani são palco de freqüentes manifestações pela volta do domínio francês. Em 1997, elas chegaram a declarar a independência de Comores, associando-se unilateralmente à França. Com a recusa do apoio dos franceses, a população das duas ilhas passou a sofrer com os enfrentamentos entre as tropas do governo e os separatistas. De maioria muçulmana, a população de Comores fala, além do francês, o árabe e o comoriano, que é uma língua que mistura árabe com suaíli (língua falada no oeste da África). Assim, a origem do nome do país vem do árabe qamar, que significa “lua”. Devido à colonização francesa e o fluxo constante de pessoas que passam por Comores, a população local tem boas porções de indianos, africanos, europeus e chineses. A grande biodiversidade marinha também é uma marca das ilhas. Entre outras espécies, por ali habita um peixe especial chamado celacanto. Esse peixe pode chegar a 1 metro e meio de comprimento, tem dentes muito fortes, se alimenta de outros peixes e suas nadadeiras são semelhantes a patas. Não por acaso, o apelido da seleção nacional de futebol de Comores é “Os Celacantos”.

Melhores das ilhas

De 1979 até 2003 o campeonato de Comores era jogado no sistema de liga, tal qual conhecemos no Brasil: os times jogando entre si em sistema de turno e returno. A ilha de Ngazidja dominou o futebol local nesse período: os times que mais se destacaram foram o Coin Nord, o Etoile du Sud e o US Zilimadjou. A partir de 2004, os dirigentes da Federação Comoriana passaram a organizar o campeonato local em função das ilhas que compõem o país. Assim, cada ilha disputa uma liga interna. Os campeões de cada ilha se enfrentam e o campeão nacional é conhecido. De lá pra cá, o Coin Nord permanece como um dos melhores do país, mas agora tem a companhia do AJSM (Association Jeunesse Sportive de Mutsamudu), da cidade de Mutsamudu, que fica na ilha de Nzwani, ameaçando assim o domínio de Ngazidja no futebol comoriano. No último dia 2 de março, as Comores foram testemunhas de outro jogo histórico: o atual campeão nacional, o Coin Nord, recebeu o Curepipe Starlight, das Ilhas Maurício. Foi a primeira vez que as Ilhas receberam um jogo válido por um torneio internacional de clubes. O jogo, válido pela fase preliminar da Copa dos Campeões da África, acabou com uma vitória dos campeões comorianos por 1 a 0. No entanto, como o Curepipe venceu o primeiro jogo por 2 a 0, o Coin Nord foi eliminado logo na primeira fase. Embora novato no futebol e pequeno na geografia, Comores tem condições para evoluir e, quem sabe, sonhar com colocações melhores no futebol africano. Como se trata de uma federação com pouco tempo de filiação aos órgãos internacionais, é possível elaborar um planejamento em longo prazo e aplicar os recursos enviados pela FIFA da melhor maneira possível, ajudando a seleção e os clubes.

*Texto de minha autoria publicado na coluna "Conheça a Seleção" do site Trivela

sábado, 22 de março de 2008

Salve(m) o XV de Novembro

Antigo distintivo do XV de Piracicaba

Parece que foi ontem.

No dia 28 de Janeiro de 1995, eu, um tio e mais alguns amigos aprontamos os carros e nos dirigimos a Piracicaba para ver o Corinthians jogar. Por lá muito sol e calor e a cidade estava toda tingida em preto e branco ansiosa para ver a estréia dos dois times no Campeonato Paulista.

No final do ano anterior, o Corinthians havia perdido o Brasileirão para o Palmeiras. Uma reformulação geral veio e jogadores como Gralak e Branco foram dispensados. Em contrapartida chegaram Vítor, Bernardo e Fabinho. Além disso, os principais nomes do time foram mantidos: Ronaldo, Souza, Marcelinho e Viola.

Três dias antes desse jogo, o Corinthians havia ganho a Taça São Paulo de Futebol Junior, batendo a Ponte Preta por 3-2. Desse time, o técnico Eduardo Amorim aproveitou alguns talentosos jogadores surgidos de lá, caso de Zé Elias, André Santos e Silvinho. A torcida estava de bem com o time, que surgia como um dos favoritos à conquista do título paulista daquele ano.

Do outro lado aparecia o XV. Com injeção de capital vinda de seus patrocinadores recém contratados (TAM e Umbro) o time trouxe um reforço considerável: o volante Doriva, que havia atuado no São Paulo com relativo sucesso, conquistando títulos importantes. O elenco contava ainda com o zagueiro Biluca, o goleiro Anselmo e o atacante Cláudio Moura. No banco, o Nhô Quim tinha o excepcional Rubens Minelli.

No final do jogo, com calor e tudo, o XV ganhou por 2-1. Fomos obrigados a ver uma bela exibição do time do interior, com marcação cerrada, aplicação tática e valentia de sobra. Parecia que o time de Minelli daria muitas alegrias à torcida quinzista ao longo do Paulistão.

Mas somente parecia. Aquela seria a última participação do XV na primeira divisão do futebol paulista. O time cairia e subiria para a segunda e terceira divisões, sem o mesmo sucesso dos anos anteriores.

Apesar da queda no estadual, o final do ano reservaria uma grande glória para o XV: o time sagrou-se campeão da Terceira Divisão do futebol brasileiro, disputando a final contra o Volta Redonda. O número recorde de 104 participantes na terceira divisão trouxe um brilho ainda maior para a conquista do Nhô Quim.

Nos anos seguintes em que o time disputaria a segunda divisão do futebol brasileiro, o XV fez parte do mesmo torneio que Ponte Preta, Náutico, Santa Cruz, Paysandu, Bahia e Fluminense também disputavam. Depois de alguns sucessos e fracassos, o XV novamente caiu pra terceira divisão nacional em 2002 e deixou de disputá-la dois anos depois devido a problemas financeiros.

Atualmente, o temido XV de outrora é apenas uma sombra do que foi o time um dia. Um XV forte, vice-campeão paulista de 1976, está sumindo aos poucos. Hoje apenas restam lembranças de um passado glorioso que o tempo parece apagar.

Mesmo disputando com dignidade a Série A-3, um time da tradição do XV não deveria ficar de fora da elite do futebol paulista. Sua torcida fanática e fiel continua indo ao Barão de Serra Negra prestigiar os jogadores que tentam trazer o XV para o lugar que lhe é devido. A caminhada é difícil e os adversários são perigosos. Flamengo de Guarulhos, Votoraty e SEV/Biônico são, por enquanto, os times que o XV tem que enfrentar para subir à segunda divisão paulista.

No último dia 3, o fundo do poço parecia ter chego ao clube: O time foi punido com a perda de seis pontos na disputa da A3. A falha: a escalação irregular de um jogador (Rafael Gonzáles) contra o São Carlos. À época, o time tinha 7 pontos e ficou reduzido a apenas um.

Com esse acontecimento, muitas pessoas temeram pelo fim das atividades do futebol profissional do clube, já que a situação financeira do XV continua não sendo das melhores. Até os mais apaixonados defensores do Nhô Quim temiam pelo pior.

No entanto, no último dia 17, veio a notícia que todos esperavam: o XV recuperou os pontos perdidos da A3. Como o julgamento de Rafael aconteceu depois da Série A3 já ter começado, o clube foi absolvido, já que a punição só vale para a competição seguinte ao julgamento. Assim, o jogador terá que cumprir suspensão de uma partida no próximo campeonato organizado pela FPF. O XV, assim, subia a 13 pontos e ficava numa posição intermediária na tabela, podendo chegar ao G-8 nas próximas rodadas.

A situação atual do XV serve para ilustrar bem as consequências de uma administração trágica, aliada a diretores técnicos incompetentes e falta de profissionalismo para tratar de questões relativamente simples, como essa punição recebida pela FPF.

A solução para o XV pode estar na formação de novos talentos. Para um clube que revelou Mazzola, De Sordi, Chicão e Pianelli, o investimento nas categorias de base deverá ser cada vez mais priorizado para que o futebol gere lucro ao clube. Com uma administração séria e os recursos aplicados em melhorias de infra-estrutura para a revelação de novos jogadores, o time pode criar condições para sua sustentabilidade e obtenção de melhores resultados no futebol. No começo desse ano vimos que é possível. Na Copa São Paulo de Futebol Junior, o XV ganhou do Flamengo por 3-2.

Atual distintivo do XV de Piracicaba

segunda-feira, 10 de março de 2008

Brunei: Rico em petróleo, pobre em futebol


Há um lugar onde as mulheres saem às ruas cobertas dos pés à cabeça, o calor é escaldante, existe uma grande concentração de petróleo e seu governante máximo é bilionário. Se você pensou em algum país do Oriente Médio, pensou errado.

Brunei é um país cujo território fica localizado ao nordeste da ilha de Bornéu, no Sudeste Asiático. A parte norte dessa ilha faz parte da Malásia, e a parte sul é controlada pela Indonésia. Encravado na parte malaia está o sultanato de Brunei, que, entre os séculos XIV e XVI, era muito poderoso. O país dominava toda a ilha de Bornéu e uma parte do arquipélago das Filipinas. No entanto, algumas disputas perdidas com a Malásia (então colônia do Reino Unido) reduziram substancialmente o território do país, resultando numa divisão em duas partes. A partir de 1888, o Reino Unido passou a colonizar também Brunei. Em 1984, finalmente, o país obteve a sua independência, e o regime de sultanato foi reinstalado.

Como o país está encravado no território malaio, os mais marcantes traços culturais de Brunei são a religião muçulmana, predominante na maioria da população, e a rigidez com que ela é seguida no país, exatamente como ocorre em seu único vizinho. Por conta disso, as mulheres do país são obrigadas a circular pelas ruas com a burca (vestimenta que cobre todo o corpo), e a venda de bebidas alcoólicas é proibida para os que professam os ensinamentos de Maomé. O petróleo é atualmente a maior fonte de renda do sultanato, o que coloca o país com uma das maiores rendas per capita do mundo. O sultão de Brunei, Hassanal Bolkiah, figura como um dos cinco homens mais ricos do planeta, com uma impressionante fortuna pessoal de mais de US$ 29 bilhões.

Uma seleção e um combinado

Fundada em 1956 sob o nome de “Brunei State Football Amateur Association”, a federação bruneiana de futebol só realizou o primeiro jogo oficial da seleção em 1972. Em jogo válido pelas eliminatórias da Copa da Ásia, Brunei foi derrotado pela Malásia por 8 a 0. Desde então, a seleção sofreu goleadas atrás de goleadas, como um 10 a 1 da China em 1975. A partir de 1983, a seleção passou jogar com mais regularidade, chegando a disputar as eliminatórias para a Copa do Mundo de 1986, na qual mais derrotas fragorosas aconteceram: levou 8 a 0 de Hong Kong e da China. Além disso, a seleção sempre contribui também com muitas derrotas na Tiger Cup, que reúne as nações do Sudeste Asiático.

No mesmo ano de 1983, a federação bruneiana de futebol montou um time, o Brunei M-League, para disputar a Copa da Malásia. Como não havia futebol profissional nem liga de futebol em Brunei, o país passou a disputar essa copa como se fosse um clube de Malásia. É bom salientar que o time montado pela federação permitia o ingresso de estrangeiros. Sendo assim, não se pode afirmar que a seleção nacional de Brunei participava de um campeonato de clubes.

Apesar de ter se filiado à Fifa em 1969 e à Confederação Asiática de Futebol um ano depois, somente em 1993 o futebol no país tornou-se profissional e a palavra ‘Amateur’ foi retirada do nome oficial da federação. Em 1999, ocorreu a maior glória do futebol bruneiano: o Brunei M-League venceu a Copa da Malásia contra a equipe do Sarawak e venceu por 2 a 1, com dois gols de Rosli Liman, considerado até hoje herói nacional no sultanato. Muitos habitantes de Brunei foram até a capital da Malásia, Kuala Lumpur, e lotaram o estádio para ver o combinado bruneiano na final.

Essa conquista deu ânimo aos dirigentes da federação bruneiana para tentar voar mais alto no futebol asiático. Assim, a seleção nacional foi inscrita para participar das eliminatórias da Copa de 2002. O resultado para Brunei não poderia ter sido mais desastroso: o time perdeu todos os jogos, não fez nenhum gol e levou a pior goleada de sua história, 12 a 0 para os Emirados Árabes.

Liga recente e time tipo ‘exportação’

Na esteira da Copa de 2002, a federação bruneiana decidiu criar a Brunei Premier League, reunindo os 12 melhores times do país e angariando o patrocínio de uma empresa multinacional do ramo petrolífero. Todos os jogos seriam realizados no moderno estádio Sultan Hassal Bolkiah, com capacidade para 30 mil pessoas.

No primeiro ano, o time do Duli Pengiran Muda Mahkota (ou DPMM, como é mais conhecido), faturou o título da temporada. A equipe é gerenciada por Al Muhtadee Billah, que é filho do sultão de Brunei e em algumas vezes jogava como goleiro do time. Com os recursos para trazer jogadores garantidos por ele, o clube sagrou-se mais uma vez campeão em 2004 e então foi convidado a disputar a Premier League da Malásia, a segunda divisão do país. Em 2005, garantiu o acesso à elite e também substituiu o Brunei M-League na disputa da Copa da Malásia. Os principais jogadores do time são o brasileiro Tiago dos Santos (vindo do Extrema, de Minas Gerais) e Shahrazaen Said, que foi um dos artilheiros da Super League na temporada passada, com 22 gols.

O sucesso da equipe, no entanto, não agrada nem aos bruneianos nem aos malaios. Por um lado, os bruneianos reclamam que o DPMM sempre contrata os melhores jogadores do país, esvaziando a liga local e levando os talentos dos times menores. Como a federação bruneiana não incentiva os clubes financeiramente, a liga local não se desenvolve, e a seleção também não. Com isso, Brunei não se inscreveu para disputar as eliminatórias da Copa de 2006 nem as de 2010. Apesar do incentivo ao futebol local ser cada vez mais escasso, nas sete últimas partidas que Brunei jogou houve uma melhora: duas vitórias, dois empates e três derrotas.

Além, a presença do DPMM na Copa da Malásia está com os dias contados. Por conta de uma forte pressão na Malásia para que somente os clubes malaios possam competir nas copas do país, a federação local comunicou que o DPMM está fora da Copa da Malásia, podendo disputar somente a Super League na próxima temporada.

Isso, no entanto, não significa que o DPMM voltará a jogar na liga de Brunei. E assim, esse país rico em petróleo continuará vivendo a estranha situação de não ter riqueza suficiente para segurar seu melhor time no campeonato do país.


*Texto de minha autoria publicado na coluna "Conheça a Seleção" do site Trivela

terça-feira, 4 de março de 2008

OFF - Parada

Devido a questões profissionais, esse blog ficará sem atualização até o dia 9 de março.